As águias do Palácio do Catete
Construído entre 1858 e
1867, o Palácio do Catete ostentou, inicialmente, águias em seu topo, fazendo
alusão ao símbolo escolhido pelo Barão de Nova Friburgo para sua heráldica. Representando o poder, símbolo de Roma, atributo de Júpiter, as águias,
originalmente menores do que as atuais, fizeram com que o edifício fosse
conhecido também como “Palácio das Águias”.
Detalhe da pintura de Emil Bauch. Barão e Baronesa de
Nova Friburgo. Notem a proporção das águias originais. Banco
Safra, 2011. p. 15
Foto de Marc Ferrez, cerca de 1880 do Catete e seus
arredores. Detalhe para o jardim original e as palmeiras já razoavelmente
crescidas. Nessa foto vemos a praia do Flamengo antes de todos os aterros
feitos no século XX. Reparem que as águias originais são muito menores que as
atuais. Instituto Moreira Sales.
http://brasilianafotografica.bn.br/brasiliana/handle/bras/1881
O Palácio foi vendido
pelo filho do Barão de Nova Friburgo, em 1889, ao Conselheiro Francisco de Paula Mayrink,
que tomou a decisão de retirar as águias do topo do prédio. Periódicos fazem referência
constante ao fato, alegando que estas obras, supostamente de zinco modelado
(A Notícia 7/6/1907), estavam em más condições e teriam sido arremessadas do
teto do palácio nesse período. Outras tradições dizem que a superstição do
Conselheiro contribuiu para a retirada das águias do topo do edifício....
ROURE, Agenor de. Au Jour le jour: Palácio do
Presidente. A Notícia. Rio de
Janeiro, 23/9/1896. P. 1
O palácio sem as águias. Panorama do bairro do Catete.
Foto de Marc Ferrez. 1895. Acervo Museu da República.
Em 1896, o governo
Federal comprou o edifício para ali instalar a Presidência da República.
Reformou o Palácio e o parque e, no lugar vago das águias, instalou sete
estátuas, conforme descrição do Jornal do
Commercio de 20/02/1897:
Em
frente no respaldo das paredes acham-se enormes estátuas. No centro a da
República tendo à direita a Agricultura e a Primavera, à esquerda a Justiça e o
Outono e nos fundos e ao lado do parque a do Inverno e do Verão.
Palácio do Catete com
esculturas no lugar das águias. Foto de Marc Ferrez, 1897. Acervo Museu da República.
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Nesse período, as águias originais
continuaram na mente dos cariocas e literatos. Machado de Assis, em Esaú e
Jacó, em 1904, fez referência às águias ao relatar, em passagem que se
referia à década de 1870, a cobiça do personagem Santos, ao olhar o palácio:
Ao passar
pelo Palácio Nova Friburgo, levantou os olhos para ele com o desejo do costume,
uma cobiça de possuí-lo, sem prever os altos destinos que o palácio viria a ter
na República;
Já lhe
não bastava o que era. A casa de Botafogo, posto que bela, não era um palácio,
e depois, não estava tão exposta como aqui no Catete, passagem obrigada de toda
a gente, que olharia para as grandes janelas, as grandes portas, as grandes
águias no alto, de asas abertas. (2004, p. 36)
Diante de toda a
polêmica, em 1907, no governo de Afonso Pena, decide-se retornar com as águias
ao topo do Palácio (A Notícia 5/06/1907 e 8/06/1907). Houve questionamentos sobre a possibilidade de manter a estátua da República, ao centro das demais. Fato que gerou
discussão e charges satíricas, como a encontrada em O Malho, de 15/6/1907, onde vemos políticos nos lugares das águias
(p.27).
Três anos depois, em 1910, o assunto voltou à imprensa, após grandes mudanças
na política: Afonso Pena morrera no ano anterior e seu vice, Nilo Peçanha,
assumiu o governo; A campanha civilista, do eterno candidato à presidência Ruy
Barbosa, estava a todo vapor, mas acabou derrotada pelo candidato Hermes da
Fonseca .
Em fevereiro de 1910, a
revista Fon Fon informa a chegada das
sete estátuas de bronze, “modeladas pelo escultor Rodolpho Bernadelli e
fundidas na Europa”. O texto, carregado de ironia, faz alusões a Ruy Barbosa, conhecido como a
“Águia de Haia”, e a diversos locais da cidade do Rio de Janeiro.
A revista O Malho,
de 26 de fevereiro daquele ano fez uma referência às águias, relacionando-as com o momento político de então (p.13):
Ruy Barbosa, em edição de O Malho de 19 de março de 1910 (p.36),
já sacramentada sua derrota nas eleições presidenciais daquele ano, não foi
poupado na comparação com as águias que conseguiram entrar no Palácio do Catete...
Deixando a “Águia de Haia”
de lado, uma foto de uma parada comemorativa de 24 de fevereiro 1910, da revista
Careta, de 5/3/1910, mostra o palácio
ainda com as esculturas alegóricas em seu topo (p.21).
Não consegui uma imagem ou uma reportagem referente ao
dia exato da instalação das águias, mas, na edição de 9 de abril de 1910, a
revista Fon Fon faz uma referência ao
retorno das águias ao Palácio (p.12):
Em 11/6/1910 a revista O Malho apresenta uma caricatura ironizando o aspecto das águias,
vistas pelo povo (p.15):
Em 24/9/1910 outra caricatura com a mesma crítica, em O Malho (P. 35)
Na edição de 29
de outubro de 1910, a revista Careta
faz a seguinte referência, numa coluna que ironiza fatos da política nacional (p.29):
Até hoje, as águias, projetadas
por Rodolpho Bernardelli, encomendadas no governo de Afonso Pena e instaladas
por seu sucessor, Nilo Peçanha, estão encimando o Palácio do Catete. O prédio
deixou de ser conhecido pelo grande público como “Palácio das Águias”. Hoje,
lembra-se mais do edifício como local onde Getúlio Vargas se matou, mas elas
estão ali ainda, pairando a Rua do Catete.
Referências
ASSIS, Machado. Esaú e Jacó. Rio de Janeiro, Nova
Fronteira. P. 36
MUSEU DA REPUBLICA. São Paulo, Banco Safra, 2011.p. 15
Catete e seus arredores. Instituto Moreira Sales. Foto
de Marc Ferrez, cerca de 1880. http://brasilianafotografica.bn.br/brasiliana/handle/bras/1881
Panorama do bairro do Catete. Foto de Marc Ferrez.
1895. Acervo Museu da República.
A
Notícia, 5/06/1907, p.1
_______, 8/06/1897. P. 1
Careta,
5/3/1910. p.21
Careta ,
29 de outubro de 1910. p.29
Fon
Fon, 19/2/1910, p. 26
Fon
Fon, 9/41910, p. 12
O
Malho, 15/6/1907, p.27
O
Malho, 26 de fevereiro de 1910. p.13
O
Malho, 19 de março de 1910. p.36
O
Malho, 11/6/1910. p.15
O
Malho, 24/9/1910 P. 35
ROURE, Agenor de. “Au Jour le jour”: Palácio do
Presidente. A Notícia. Rio de
Janeiro, 23/9/1896. P. 1
As aves que estão no Palácio do Catete são harpias. A harpia é considerada como a maior e mais pesada ave de rapina com envergadura, isto é abertura das asas, de 2 metros e meio com peso de dez quilogramas. Outros nomes estão: Gavião-Real, Uiráçu (do tupi “uirá” pássaro e “açu” ou “assu” grande). No entanto o nome “harpia” foi dado por europeus que vieram ao “Novo Mundo” e acreditavam estar vendo as figuras mitológicas também conhecidas como sereias (depois é que passaram a creditar mulheres-peixe como sereia, antes eram o que foi chamado depois de “harpia”). No entanto alguns nativos chamavam a ave de “uiruuetê” ou “uirá etê” ave verdadeira.
ResponderExcluir...
Apesar do nome de “gavião-real” a harpia pertence a família “Accipitridae” que envolve mais de 220 espécies como o Gavião real (Harpia harpyja) e águia-careca-americana (Haliaetus leucocephalus). A “Águia Real” ou “águia dourada” (Aquila chrysaetos) – da qual deriva meu sobrenome “Aguiar” e que representa o Império Romano, Rússia, Alemanha e outros países que adotam o animal como heráldica.
Obrigado pelo comentário, Marco!
ExcluirJá havia ouvido a hipótese de serem harpias as águias atuais. No entanto, até onde vi, os contemporâneos da mudança das águias não fizeram referência a esse fato, talvez por desconhecimento. Vou pesquisar mais um pouco sobre isso e, caso encontre alguma referência às harpias, faço uma atualização do post. Um abraço!
Na fazenda do barão em Cantagalo há uma residência conhecida como palácio do gavião.
ResponderExcluirObrigado pelo comentário, Paulo!
ExcluirÉ verdade. Inclusive, numa pintura do palácio do Catete, o solar está representado, junto com outras propriedades importantes do Barão.
Parece que, infelizmente, o local está fechado atualmente para visitação...
Um abraço!
parabéns pela publicação.
ResponderExcluirObrigado, Sr. Miguel!
ExcluirComo faço para comprar seu livro?
ResponderExcluir980675505
Segundo o historiador Gustavo Barroso em matéria publicada no Diário Carioca de 25/6/1959, trata-se do gavião de penacho (Harpia Feroce), uma ave nacional que está representada no desenho do ex-libris do Museu Nacional. Você tem a informação que as antigas esculturas de ferro foram fundidas para a fabricação dos bancos do jardim do Palácio?
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